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sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Cortando o Coração


Logo ao acordar, vi que já era um pouco tarde; tenho dormido muito e isso é bom porque relaxa a mente e acalma os nervos; fiz um café e suco de maracujá rapidinho e fui à padaria. Ao atravessar a perigosa encruzilhada ouvi alguém falar: professora! Automaticamente olhei.

Era uma mulher que há cinco anos atrás, era uma aluna adolescente. Quase não reconheci Marina, ela estava amadurecida aparentemente e trazia consigo três criancinhas: um bebê e duas meninas numa faixa de três a cinco anos. A alegria foi grande, nos abraçamos matando saudades.

Marina parou de estudar, saiu de casa e nem terminou o ensino fundamental. Bem ao lado da minha casa há um posto de saúde e ela veio consultar uma das crianças, o bebê, que estava doentinho. Apesar dos conselhos que dei na época para que terminasse os estudos, Marina desistiu.

Então ela me contou que a situação dela não estava nada boa, morando numa invasão com três crianças, sem estudos e sem trabalho, pois não tinha com quem deixar os filhos e o rapaz com quem vive também não terminara os estudos.

Eu olhei-a nos olhos e disse: Marina, falta de conselho não foi, esse assunto sempre debati com vocês na sala de aula. Ela sorriu timidamente como a assentir o que eu falara. Assim me despedi, desejando boa sorte, abraçando-a e ao me virar para ir embora, ela disse: espere!

Ao voltar-me,  meio envergonhada, ela explicou que não tinha nada para servir às crianças no almoço e me pediu dez reais para comprar uns pedaços de frango para fazer uma canja. 

Essas situações me cortam o coração, peguei o que tinha na carteira, naquele momento eu estava com quinze reais. Ela agradeceu muito e se foi. 

Por um momento, fiquei ali, parada, recordando aquela adolescente linda e alegre que conheci e fiquei muito triste por naquele momento, ter apenas os quinze reais na carteira. 

Como educadora, tenho tido sucesso na orientação das meninas mas não com unânimidade, domingo por exemplo, veio um ex aluno me visitar que já havia sido preso por causa de drogas. Outra garota, veio pedir leite para o bebê. Todos provenientes de classes sociais muito carentes. 

Marina não é a primeira nem será a última e isso me deixa meio que sem ação porque costumo acompanhar a mesma turma de quinta a nona série. Criamos um laço de amizade grande e isso é inevitável - mas não desisto e insisto ano após ano, mostrando a eles que sem os estudos e uma profissão, se aventurar a ter filhos, é condená-los a serem também sofredores. O resultado no geral tem sido positivo mas há exceções como a de Marina que me cortam o coração.

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